segunda-feira, 2 de março de 2015

Rio de Janeiro


 
Rio de Janeiro

(1 de Março de 1565/450º aniversário da fundação da cidade)

A baía da Guanabara («água penetrante» na língua tupi) alimentou durante muitos anos a ilusão de que ali desaguava um rio. Isso o escreveu o primeiro governador do Brasil, Tomé de Sousa, em carta enviada a D. João III (1 de Junho de 1553): «[…] que pinte quem quiser como deseje um Rio, isso tem este de Janeiro».
A baía permaneceu durante anos desabitada de europeus. Os índios ribeirinhos que ali viviam pertenciam à grande família dos tupi-guaranis, e eram considerados dóceis em comparação com outros mais arredios. Frequentavam a baía de Guanabara navios portugueses, mas disputavam-na de forma mais ou menos pirata navios espanhóis e franceses. A região era de grande exotismo vegetal, extremamente fértil e muito cativante ao olhar.
Os portugueses inquietavam-se muito com a presença das outras potências na região, sobretudo com a estadia dos franceses, que chegaram a construir uma fortaleza, apoiados pelos aguerridos índios tamoios, inimigos dos portugueses e das outras tribos que por ali tinham o seu habitat.
O Pe. Manuel da Nóbrega insistiu então pelo estabelecimento definitivo e permanente dos portugueses na formosa baía. Finalmente, o governador Mem de Sá, em 1559, recebeu ordem de Lisboa para expulsar os franceses em definitivo. Assim se fez. Em 1563, partiu para a baía da Guanabara uma expedição comandada pelo jovem sobrinho do governador, de nome Estácio de Sá, com o auxílio da Baía, do Espírito Santo, sobretudo de São Vicente, onde os padres da Companhia de Jesus lhe dispensaram especial apoio. Beneficiando da evangelização dos padres Nóbrega e Anchieta, que ensinaram aos índios a concórdia, desembarcaram os portugueses, ajudados pelos índios amigos, a 1 de Março de 1565 (há precisamente 450 anos!) à sombra do morro «Cara de Cão» e, assim, foi fundada a cidade do Rio de Janeiro,
Todavia, os índios tamoios, manipulados pelos franceses (que não se conformaram com a perda da sua fortaleza) incomodavam quanto podiam a empresa portuguesa. Apesar das dificuldades, Estácio de Sá fundou a cidade segundo as normas oficiais da época. Não foi, pois, uma povoação que nasceu de algumas casas ou cabanas: - O Rio de Janeiro não foi aldeia, depois vila e, finalmente, cidade. Estácio de Sá ergueu, embora de forma rudimentar, toda a máquina administrativa.
O que se diz das cidades capitais que deram origem a nações, aplica-se de forma excepcional ao Rio de Janeiro, pelo seu desempenho como centro aglutinador, dando ao Brasil a coesão elástica, o vigor inquebrantável, a exótica e musical personalidade.
Sem o Rio velho dos Sás, pelo menos de 1565, integrado depois no conjunto que é a América de raiz cultural portuguesa, não teríamos talvez o Brasil, único e inteiro. A fundação do Rio de Janeiro é de facto uma epopeia… à medida de Luís de Camões!
E sobre tudo isto o Corcovado, com o seu monumental Cristo Redentor, coroando a cidade que, a seus pés, desenha o mais inesperado, multiforme e discordante espectáculo da vida humana!
Nas comemorações do 4º centenário (1965) da cidade, escreveu Vitorino Nemésio, na sua Ode Ao Rio/ ABC do Rio de Janeiro, estas tão sentidas composições:
 «[…]
Rio velho sangue tem
Na folha da amendoeira:
Muita gente lhe quis bem
Mas nunca desta maneira.».
 
Cabe no Rio o Brasil todo. Cabe no Rio de Janeiro a história da mais penosa e edificante emigração portuguesa! Ali sambaram portugueses e libaneses, italianos e espanhóis, que todos lá trabucaram, todos lá foram sendo o Brasil.
Um dia despedi-me do Rio de Janeiro como se de Portugal partisse, e o estranho sentimento não se obrigou a palavras, mas a sons e musicalmente, dedilhando violão de marca.
Grandíloqua é a história do Rio de Janeiro, académica nunca, por graça de Deus e amor de muitos poetas!
 Lembro outra vez Vitorino Nemésio:
«Rio tem Largo do Machado,
Boate chique, brotinho bom,
Com mão de santo no Encantado,
Açougue à porta, filé minho,.
 
Rio tem povo na besteira,
Tem grã-finagem no piquini,
E o bem-querer na geladeira,
Mas vira fogo sendo pra ti.».
 
Esta famosa sala de honra do Brasil que é o Rio, vai ser obstruída com uma peça “artística” símbolo da imbecilidade lusitana, produzida por artista plástico (Joana Vasconcelos) representativa da vacuidade actual: - Um galo de Barcelos (Pop Galo) de sete metros de altura, programado para desembarcar na Praia do Leme a 10 de Junho!
Apesar da manifestação cultural sumária, pobre e mal pregada ao 10 de Junho, desculpa lá Rio de Janeiro este “brasão” formidável que nos querem pintalgar para a posteridade! Desculpa lá, ó Rio de Janeiro, faz-nos o favor de ver nisso apenas largo roda pé de azulejo, nada mais e, logo que possas, livra-te do hirto galo, sinergia de uma raça de gente coarctada, que não te merece um carinho!

 


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