quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

QUANDO NASCEU O MENINO JESUS

Quando nasceu o Menino Jesus…
(pequena história de Natal para os “meus” leitores)
©Joaquim Palminha Silva

Historiadores sagrados e profanos estão de acordo que o Menino Jesus veio à luz em Belém (faz precisamente 2012 anos), povoação de “meia dúzia” de fogos, distante de Jerusalém cerca de duas léguas. Os pais tinham vindo de Nazaré dar o seu nome ao censo decretado por César Augusto em todas as terras sob domínio do Império Romano… Era então um acto de soberba imperialista saber quantos habitantes da terra dominava e escravizava a águia romana…

O casal (Maria e José) encontrou em Belém as hospedarias e estalagens a abarrotar de forasteiros e José, como a esposa começasse a sentir a aproximação do parto, resolveu acolher-se a uma corte de gado encostada na rocha duma pedreira “fora de serviço”, nos arredores da povoação. Sem aquela súbita lembrança teriam dormido ao relento, como faziam os serranos naturais do lugar, isto nos afiança Frei Pantaleão de Aveiro, no seu maravilhoso «Itinerário da Terra Santa e Suas Particularidades […]», obra publicada em Lisboa no ano de 1593, que é a verdadeira reportagem do que observou na região o bom do frade, pois por ali jornadeou algum tempo, seguramente não como turista.

Nasceu o Menino Jesus num presépio (segundo antiga definição é lugar onde se recolhe o gado, estábulo), sem queixa nem moléstia de sua santíssima mãe, tendo à sua cabeceira apenas S. José e, seguramente, uma legião de anjos para o que desse e viesse, mas que na altura ninguém naturalmente deveria ver a olho nu. Fosse como fosse, muito se falou também se haveria na “santo” local uma burra e uma vaca como idealizou S. Francisco de Assis na sua primeira reconstituição do presépio. Todos sabemos como este santo era muito amigo dos animais, pelo que não há nada a estranhar de idealismo tão franciscano! O facto é que após ele, quantos poetas e pintores se ocuparam do acontecimento, eruditos e populares, tiveram sempre em consideração a presença real dos animais, pelo que, para concluirmos na língua de S. Francisco, se non è vero, è bene trovato!

A história conta-nos que Maria fez a longa jornada de Nazaré a Belém, talvez trinta léguas das fartas, a cavalo numa jumenta, que o marido ia tangendo com um ramo de giesta. Assim, está explicada a presença de um dos animais no presépio. Quanto à vaca, essa já lá deveria estar…

A noite de 24 para 25 de Dezembro foi uma noite de prodígios… De facto, ruiu em Roma o «templo da paz», explicaram os entendidos o fenómeno que, embora há mais de quatro anos não se ouvisse uma espada sair da bainha de um legionário, tinha ali o seu fim aquela paz morta, a paz podre assegurada pelos fáscios romanos, começando a erguer-se a paz celeste, proclamada pelos anjos e arcanjos. Parece que também se calaram os oráculos nos bosques sagrados da Hélade, e na terra latina ouviram-se os lamentos das pitonisas e outras “divindades” voluptuosas, mergulhando para todo o sempre na lenda, donde às vezes saem para entrarem literatura fantástica e na sétima arte. Ainda em Roma, esteve a correr o azeite com fartura e à franca, para quem o queria apanhar, coisa que nos assombra hoje, tão racionado vemos tal género para as nossas bolsas de lusitanos cristianizados… Na Espanha, segundo Eusébio de Cesareia (c.265-340), escritor eclesiástico, viram-se três sóis ao meio-dia, fenómeno que convém registar com reserva (mesmo dentro da categoria dos milagres!), pois o autor nunca andou por terras de Espanha ou praias de Portugal…
 
Nessa noite acudiram ao presépio os pastores dos arredores, com braçadas de flores, frutos e aves de capoeira que ofereceram ao Menino Jesus. Estas populações camponesas de que tanto gostava mestre Gil Vicente, e os nossos singelos barristas eternizaram nos seus bonecos… Lembro aqui, com especial carinho, por exemplo, da graciosidade dos bonecos de barro vidrado e policromado de Estremoz…

Dias depois de 25 de Dezembro, em dromedários ajoujados de guizos e franjas de garrida variedade, estacaram à entrada do presépio os chamados reis magos!

Quem eram, o que queriam e donde vinham? – Segundo a história crítica, eram três “agentes secretos” enviados por Herodes, o Grande, com o objectivo de matarem o Menino Jesus, apresentado pela Astrologia judaica como futuro rei da Judeia. Pois que sentimento poderia ter um monarca despótico que não fosse eliminar todo aquele que à sua beira viesse a governar também?!

Todavia, a história é muito vaga no que se refe a estas três personagens pitorescas, que ficaram na tradição com os nomes de Gaspar, Baltazar e Melchior… Os gregos atribuem-lhes outros nomes e a tradição alquimista, via nos três magos os profetas Enoque, Elias e Melquisedeque que, descidos do céu, vinham adorar o Menino Jesus…

Eram oriundos de que nação ou tribo estas maravilhosas personagens? – Da Arábia, da Mesopotâmia, da Caldeia, ou pura e simplesmente da Samaria? Nesta controvérsia secular também entrou Portugal, pela pena de generosa beleza do nosso Pe. António Vieira que afiança, sem pestanejar, que um dos reis era nem mais nem menos que o monarca de Cranganor, na Índia, onde depois erguemos o pendão das quinas. Este rei veio depois a chamar-se Cheriperimale, concluindo, assim, o nosso grande pregador que, na veneração pública a Jesus, se adiantaram estes longínquos povos aos próprios Apóstolos! – Enfim, esta versão é tão estapafúrdia como a outra que faz dos magos “agentes secretos”!

Já agora, vamos seguir esta ficção, a ver no que vai dar…

Parece que os alforges dos dromedários vinham atulhados de ouro, incenso e mirra, supõem os historiadores críticos, materiais prontos para subornar, pois supondo tratar-se do nascimento de príncipe de alto coturno, defendido por falanges de temíveis mercenários, não se podia regatear moedas de ouro a este e aquele, até chegar à prática do crime, da morte do inocente!

Mas os três magos encontraram-se com um menino deitado numas palhinhas junto a sua Mãe, uma donzela acompanhada por um homem sobre o maduro, de calos nas mãos denunciando o ofício de marceneiro-carpinteiro, e barba mal tratada. Entretanto, o menino tanto fazia “beicinho” como, de olhos fechados, dormitava numa paz comovente… Então, face àquela humilde, serena e radiosa simplicidade, os três homens, contritos se não tocados da graça, dobraram os joelhos e entornaram ali mesmo o seu ouro, mirra e incenso! Depois, partiram como tinham vindo… E nunca mais ninguém os viu nem deles ouviu falar!

Que fez Maria daquelas riquezas que ofereceram ao Menino Jesus? - A ter existido semelhante oferta de tais riquezas, estou em crer que as repartiu pelos humildes pastores, pelo povo de Belém…

Com efeito, cerca de quarenta dias depois, quando apresentou no Templo o Menino Jesus para a purificação, Maria não teve com que comprar o cordeiro que era costume dar aos sacerdotes judeus… Nas mãos do velho e respeitável Simeão, Maria depositou apenas duas rolas que, naqueles tempos, era o óbolo dos pobres e necessitados.

Fim…
. . . Boas Festas!

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